sexta-feira, junho 18, 2004

Juliana e o Sol

Aqueles cálculos monstruosos de ondas eletromagnéticas da aula de física só faziam desviar o olhar de Juliana para o mundo que se via da janela da sala do cursinho. Assistir ao sol aquecer aquela linda e fria manhã de Junho era como ver, quando criança, seu pai lhe estendendo a mão e convidando-a a se levantar para uma nova tentativa após o seu primeiro tombo na bicicleta que acabara de ganhar no aniversário. Não, não queria estar ali dentro aqueles livros técnicos. Queria ir até a biblioteca do céu, que ficava em uma nuvem muito alva que se enxergava bem longe no azul celeste, e abrir o livro d’A Criação do Mundo entregando-se ao Capítulo da Natureza a fim de não voltar mais, como uma donzela da alta-corte que se estira ao calor dos braços de um camponês para sentir o pecaminoso gosto de um prazer proibido. Fechou a apostila e antes que o professor tentasse mais uma daquelas explicações que nunca explicavam nada, saiu da sala e foi para o pátio do colégio.

Não havia mais ninguém, nem mesmo um inspetor ou um faxineiro naquele grande espaço de recreio. Era somente ela e o seu sol. Ah, como se deliciava em ter o astro-rei apenas para si; não ter que dividir um feixe de luz sequer trazia-lhe ao rosto um glorioso sorriso de paz e acolhimento. Em pouco tempo os fótons penetravam-lhe a pele exposta driblando com agilidade os suaves pêlos do braço e logo era transportada para um planeta somente seu; onde só existiam as mais belas paisagens, a sua presença e o Sol que podia brilhar livremente todo o seu esplendor a rasgar límpido céu – não existiam nuvens e nem árvores muito altas para se interporem entre ela e a sua Luz -. O sol preenchia todos os seus espaços de mulher tal qual um beijo de quem se ama preenche uma carência feminina. Era como um filho que lhe aquecia o útero e fazia irradiar um calor interno para o restante do esbelto corpo de moça que trazia e fazer da sua pele a mais fina pétala, a remoer de inveja a mais linda deusa desse e de muitos outros Olimpos. Era também, figura paternal que iluminava o seu caminho fazendo-a achar uma trilha antes obscura nos mais dificultosos obstáculos e brincava com a menina traquina que ela era – fazia lhe cócegas sempre quando expunha, por menor que fosse, uma faísca do brilho da sua juvenil barriga inocente. Podia correr subindo os seus raios luminosos e voltar escorregando neles risonha e contende – batia palmas de alegria -, quando chegava e punha os pés no chão, estava pronta para repetir. Podia entrar em qualquer caverna, qualquer escuridão, que Ele a seguia e nunca deixava que lhe faltasse um único fio de luz e lhe diminuísse o dourado da sua ávida vivacidade.

Nenhum comentário:

Ao terminar de ler A Natureza da Mordida

Foi a mesma sensação de parar com o marcador página na mão após acabar um livro. Eu não sabia onde colocar meu sentimento após aquele final....